ANTHONY NEILSON

Anthony Neilson

Nasceu em Março de 1967. A sua mãe, Beth Robens, era actriz; o seu pai, Sandy Neilson, era encenador. “Fui um bebé-de-sala-de-ensaios.” A sua primeira experiência de actor foi como “miúdo num anúncio para os Caminhos de Ferro Britânicos”, e “naturalmente” absorveu muito teatro dos seus pais.

“Tinha onze anos quando vi The Widows of Clyth de Donald Campbell no Traverse. Há um momento em que as mulheres descobrem que os seus maridos morreram no mar. Nessa altura a minha mãe soltou um grito horrendo. Eu fiquei todo arrepiado. Ela era minha mãe, por isso a força emocional que eu senti foi em duplicado.”

Desde esses tempos que Neilson tem a ideia de que o teatro devia ser assim, o teatro devia exercer realmente uma força directa e muito básica. O teatro devia ser uma experiência emocional – tem de se sair do teatro a sentir alguma coisa. “Estás ali; estás com pessoas. Tens de te sentir como se estivesses a ver uma boa banda ao vivo. O teatro provocante tem de ser como o punk-rock.”

Neilson estudou teatro em Edimburgo, durante um ano, antes de ir para o Welsh College of Music and Drama em Cardiff. Um dos problemas que teve foi o facto de nunca ter sido feliz como actor. “Não gostava que as pessoas me dissessem o que eu devia fazer; sempre quis pensar numa imagem mais abrangente.” Por isso, dirige muitas vezes os seus próprios trabalhos. Também possui uma visão muito clara sobre o teatro experimental feito em locais pequenos – onde o público participa vivendo as emoções que são mostradas em palco e não fica apenas confortavelmente sentado a contemplar a peça intelectualmente. O desenvolvimento desse teatro experimental foi uma parte essencial da nova estética de confronto dos anos 90.

A seguir Neilson, voltou para Edimburgo e concorreu a um concurso de jovens dramaturgos na BBC. “Nunca tive nenhum interesse particular pela escrita, mas lembro-me de ter um sentimento estranho e muito nítido de que se escrevesse uma peça ela seria representada.” The Colours of The King´s Rose: foi radiodifundida na BBC em 1998. Em 1990 escreveu Welfare My Lovely para o Traverse.

A seguir viriam mais textos e mudar-se-ia para Londres.

Neilson foi desenvolvendo a sua maneira própria de escrever e ensaiar. Cada vez chegava com menos coisas escritas ao primeiro ensaio. Pegava em bocados e experimentava-os com os actores e via se funcionavam. Depois reescrevia-os, rápida e intensamente. Recebiam sempre a parte final do texto muito próximo da estreia. O que é que ele conseguia com isso? “Bom os actores refreiam o temperamento da sua representação porque têm uma ideia de como a peça se vai desenvolver, e o público consegue adivinhar para onde é que a peça vai pelo modo como os actores se comportam no início.”

Enquanto as sessões de trabalho normalmente duram um dia inteiro, os ensaios de Neilson duram normalmente três ou quatro horas no máximo. Isto permite aos actores descobrir a peça enquanto ela se desenvolve e permite ao autor escrever a peça como se ela fosse uma peça de roupa para os seus actores.

Neilson é daquele tipo de escritores que não gosta de submeter o seu trabalho a comités: “Há sempre uma altura em que já se reescreveu a peça até à exaustão. Perde-se a energia.” Ele escreve para o momento, para ter um impacto e não para produzir um trabalho literário. A sua energia concentra-se na tentativa de

contar uma história. Diz: “Assim que te ancoras numa boa narrativa, o próprio trabalho dir-te-á coisas sobre ti próprio” e continua, “Conta uma história, os temas virão por si próprios. A história é o caminho pelo qual o teu subconsciente encontra expressão no mundo real. Ao preocupares-te com as mecânicas da narrativa libertas o teu ego e permites que algo de mais verdadeiro surja.”

Na sua busca por um “tipo de teatro mais extremo”, e antes de se mudar para Londres, Neilson escreveu Normal: The Düsseldorf Ripper para o Festival de Edimburgo, ao qual costumava ir todos os anos. Estreou no Pleasance Theatre em Edimburgo em Agosto de 1991. A peça conta a história de Peter Kurten, o “Estripador de Düsseldorf”, um assassino em série que aterrorizou a Alemanha entre Fevereiro de 1929 e Maio de 1930 e que inspirou M, de Fritz Lang, em 1931.

Normal levanta questões sobre a violência sexual e as suas origens. “Aquilo que me fascinou no Estripador de Düsseldorf não foi tanto o facto de que ele era um assassino mas sim a maneira como o seu carácter foi predeterminado na infância.” A peça não é sobre assassínios mas sobre como a nossa educação molda a nossa definição de normalidade. Se se educarem as pessoas num ambiente completamente brutal elas verão isso como sendo a norma.

Depois escreve Penetrator, que conta a história de um soldado que fugiu da tropa e é albergado em casa de um amigo seu que vive com outro homem. O soldado age de maneira estranha, pensa que é filho de Arnold Schwarzkopf e conta a história de um quarto escuro e de ter sido torturado por um grupo de Penetradores. O soldado pede asilo ao amigo e começa a perturbar a relação da casa. As imagens e os discursos violentos alternam-se até a peça terminar com uma cena terna de amizade entre os dois amigos. Penetrator fica na nossa mente por causa da sua intensidade e não porque tem uma mensagem agradável. “O problema das peças que têm uma mensagem é que não convencem ninguém. Quero dizer, alguma vez viste uma coisa que te faz acreditar naquilo em que não queres acreditar? O teatro provoca realmente efeitos nas pessoas, mas são indirectos.”

Em 2002, Anthony Neilson escreve Stitching, que estreia durante o Festival de Edimburgo com Phil McKee e Selina Boyack. Um homem e uma mulher encontram-se para discutirem, à luz de uma gravidez, sobre a sua tempestuosa relação. Justapostas a estas cenas de conversa, existem vários encontros sexuais do casal, que ao princípio pensamos que se passaram no princípio da relação. Na verdade, estes encontros têm lugar no futuro, depois do filho que tiveram ter morrido. Estas cenas ilustram de facto os instantes finais da relação deles. As práticas sexuais destas cenas registam uma regressão na história sexual do casal, culminando na simulação de uma virgindade (à qual o título se refere). Na cena final da peça o casal decide ter o filho.

Stitching foi um dos maiores êxitos da edição de 2002 do Festival de Edimburgo. A imprensa foi quase unânime na recepção da peça. O Sunday Times disse: “A nova peça de Anthony Neilson explode com energia, disciplina, integridade e pura e cruel acuidade psicológica (…) a escrita de Neilson possui uma beleza terrível (…) ele dirige com uma clareza impecável e objectividade e a representação é incandescente como um fogo subterrâneo.” Michael Billington, no The Guardian, diria: “Anthony Neilson examina o modo como nós amamos hoje em dia com um olhar refinado que mistura ternura e equimoses.” O The Stage escreveria “Uma exploração provocadora dos limites da perversidade sexual (…) Pinter e Ravenhill vêm imediatamente à nossa cabeça, mas Neilson já conquistou o seu lugar no meio dos clássicos modernos.”

Anthony Neilson escreveu ainda Year Of The Family, The Night Before Christmas, Heredity, Hooverbag, Edward Gant’s Amazing Feats Of Loneliness, The Lying Kind, Twisted, e realizou também um filme para o Chanel Four, The Debt Collector.

Anthony Neilson esteve em Lisboa em 21 de Maio de 2004, para assistir à representação de Cicatrizes e às leituras de Normal: O Estripador de Düsseldorf e Penetrador.

Do autor nos Livrinhos de Teatro:
Realismo/ O Maravilhoso Mundo de Dissocia (nº28)

Nas Revistas Artistas Unidos:
Cicatrizes (Revista nº 9)
Normal – O Estripador de Düsseldorf (Revista nº 12)
Penetrador (Revista nº 12)
Um contador de histórias – Entrevista ao autor por Pedro Marques (Revista nº 9)
Visceral e emocional – conversa com o autor (Revista nº 12).

Nos Artistas Unidos:
2003 –
CICATRIZES , encenação de Pedro Marques (Teatro Taborda).