FOTOGRAFIAS de Miguel Ribeiro
Teatro Taborda
9 de Setembro a 29 de Novembro 2004
Quando se olha para as fotografias o que se vê não é um corpo, nem sequer uma parte do corpo. O que se vê é uma narrativa, uma história que corre sobre uma superfície que pode ser ou não ser a de um corpo. Ou, se quisermos ser específicos, o que se vê é a história de uma exploração geográfica de uma superfície que pode ser ou não ser um corpo. Podemos ver campos de trigo, terra, colinas, desertos, mares, acidentes do terreno, sugestões de vida orgânica, sugestões infinitamente ampliadas ou infinitamente reduzidas de qualquer coisa que está lá e é misteriosa. Pode ser poeira, pode ser a pele, pode ser cabelo, pode ser a poeira de estrelas, que é uma designação poética e inobservável. Podíamos estar a investigar a superfície de Marte ou a de um planeta desconhecido de um sistema fora do sistema solar. O que importa, tal como na narrativa literária, não é o que vemos. É o que julgamos ver, e o resultado dessa observação é sempre uma abstracção, em última análise, uma interpretação. Eu prefiro a abstracção.
Aquilo que me atrai nestas fotografias é a sua saliência visual, e com isto quero dizer que é impossível ignorá-las depois de as ter visto a primeira vez, e esquecê-las depois de as ter visto uma segunda vez. Ou uma terceira, ou quarta, ou as vezes que quisermos, porque a partir de determinado ponto o olhar esculpe a sua própria representação do que vê. Vê aquilo que quer e que sabe ver com os olhos que tem. É esta a essência da arte, de toda a arte. A de um mútuo reconhecimento, a de um entendimento entre o artista e aquele que explora a paisagem, a narrativa, a abstracção, proposta pelo artista.
Clara Ferreira Alves
24 Setembro 2004