Vladímir Presniakov (n. 1974) e Oleg Presniakov (n. 1969) licenciaram-se na Faculdade de Filologia da Universidade Estatal dos Urais (Universidade Górki, em Ekaterinburg). Ambos deram aulas na mesma universidade (Vladímir de pedagogia e psicologia, Oleg de história da literatura russa).
Escreveram as seguintes peças: Revestimento de Soalho (1999), Europa – Ásia (1999, radiodifundida em Outubro de 2003 em Colónia, Alemanha), Set 1. Histórias exactamente sobre o amor, quer dizer, bem… (2000), Set 2. Uma verdadeira odisseia 200 000 extensamente, pelo custo de 2 dias (2000), Terrorismo (2000), Espíritos Cativos (2001, peça sobre Alexander Blok e Andrei Belyi estreada em Janeiro de 2003 com encenação de Vladímir Ageev no Centro de Dramaturgia e Encenação, Moscovo), No Papel da Vítima (2002), Ressurreição. Super (2003), Más histórias de dormir (2003, está a ser rodado um filme por Kirill Serebrennikov) e outras ainda.
Estão ligados ao projecto russo de nova escrita inspirado pelo Royal Court Theatre de Londres e pelo British Council. Uma curta peça política dos Presniakov, We Shall Overcome, integrou a temporada internacional do Royal Court em 2002. Tornaram-se conhecidos internacionalmente a partir da estreia de Terrorismo no Royal Court em Março de 2003, numa encenação de Ramin Gray. Em 2003, a peça foi apresentada na Polónia e na Sérvia; em 2004, há produções programadas na Alemanha, Itália, Austrália e Suécia.
Terrorismo estreou em Portugal a 8 de Janeiro de 2004 no Teatro Taborda, com encenação de Jorge Silva Melo (assistido por João Meireles e Andreia Bento), cenografia e figurinos de Rita Lopes Alves, luz de Pedro Domingos, som de André Pires e interpretação de Américo Silva, Andreia Bento, António Filipe, António Simão, Carla Galvão, Cecília Guimarães, Glicínia Quartin, Isabel Muñoz Cardoso, Joana Bárcia, José Airosa, Nuno Melo, Paulo Moura Lopes, Pedro Carraca, Pedro Marques, Sérgio Gomes e Teresa Sobral, numa produção dos Artistas Unidos.
A 30 de Janeiro de 2004 fez-se no Teatro Taborda, com a presença dos autores, uma leitura encenada de No Papel da Vítima: com Américo Silva, António Filipe, António Simão, Isabel Muñoz Cardoso, Joana Bárcia, João Meireles (que dirigiu) e Teresa Sobral.
Fomos ter com Oleg e Vladímir Presniakov a 29 de Janeiro de 2004, ao Hotel Olisipo, ali mesmo ao lado do Taborda. Mal nos viu chegar à sessão de gravador em punho, Vladímir começou a contar a brincadeira que fazia aos amigos (e se calhar até ao próprio irmão), de esconder o gravador num armário com cerca de trinta minutos de silêncio, e depois fazer ouvir uma voz em baixa velocidade, num tom místico: “OO-LL-ÁÁ, PP-EE-DD-RR-OO.” Imaginámos o terror das pessoas a ouvirem a inesperada voz.
O gravador questiona-nos durante alguns segundos (o tempo que dura a nossa perplexidade causada por uma voz a sair de um armário) e durante esse instante fazemos a pergunta do como?, porquê?, impossível…? As peças dos irmãos Presniakov andam nessa fronteira, o seu mundo vem da perplexidade desse instante. Por trás desta brincadeira assentam as perguntas e as preocupações destes dois escritores russos. O terror diário que não avisa quando nos vem fazer uma visita. Um homem que faz de morto para ganhar a vida e é alheio à tragédia da própria morte. Homens em fuga para a frente.
Em Terrorismo a morte é central. O medo da morte. A morte irrompe no escritório subitamente, é base de relações entre homens no balneário dos soldados, é exorcizada na cena de comédia das comadres sentadas num banco de jardim. Mas uma delas envenenou o marido lentamente até à morte. E subitamente o real rebenta com toda a violência: aquelas aparentemente inofensivas comadres escondem a maior das tragédias. No meio de um cenário de terrorismo global vislumbramos o terrorismo que habita as nossas próprias casas. Tema que reaparecerá em No Papel da Vítima nas cenas de Vália em casa com os pais. Nesta peça encena-se a morte para lhe fugir. As peças dos Presniakov exorcizam medos e exigem respostas. Mesmo que sejam tão profundas como a existência de Deus. Tudo se explica no fim. A certa altura da conversa, Vladímir diria para o microfone: “Deus vê tudo e às vezes fala através do gravador.” Para manter o segredo, que é a alma do negócio, não diferenciámos as respostas de Oleg e de Vladímir.
Ekaterinburg
Como é que funcionava o vosso grupo de teatro em Ekaterinburg?
Irmãos Presniakov – Era um grupo dinâmico. Pouco comum no teatro russo. Normalmente costumam encenar uma peça e estar sempre a fazê-la enquanto não morrem todos os actores. Mas nós tivemos um princípio diferente: fazíamos só uma representação. Os espectadores sabiam que só tinham uma oportunidade para ver a peça. E os actores também sabiam que só iam fazer a peça uma vez. Como se fosse boxe profissional, trabalhávamos até ao esgotamento.
Eram vocês que escreviam as peças?
– Sim, éramos nós. E também as encenávamos.
Num teatro grande?
Sim, num teatro de trezentos lugares. Com quarenta actores.
Um teatro universitário?
– Sim, junto à universidade. Onde participavam estudantes e também actores profissionais.
O texto já estava todo escrito antes de irem para os ensaios?
– Na nossa opinião, um texto escrito é um texto para ler. Mas quando o vamos encenar, de uma maneira ou doutra, o texto acaba sempre por sofrer algumas alterações. Agora, quando escrevemos, usamos a nossa prática de encenadores. Por isso, aquilo que nós escrevemos é aquilo que vai ser encenado, e é quase sempre a mesma coisa. Porque já sabemos como vai ser em cena.
E quando é que abandonaram o grupo?
– Há muito pouco tempo. Agora não temos tempo.
E o grupo continua?
– Não, não trabalham. Existem três, quatro pessoas que a qualquer momento podemos usar e à volta delas fazer qualquer coisa. Na verdade, foi uma vida muito interessante. Muito intensa. Fizemos isso porque compreendemos que o teatro ainda não sabia encenar os novos textos, e os nossos textos em particular. Mas depois, com o tempo, as coisas foram mudando lentamente. Pelo menos na nossa cidade, mostrámos que o teatro pode chegar a um público muito jovem.
Moscovo
E como é que foi a passagem para Moscovo?
– Nós fomos para o teatro principal de Moscovo, o Teatro de Arte. Um grande teatro. Tínhamos de mudar alguma coisa nessa tradição. Compreendemos que naquilo que fazemos existe o que é necessário para esse grande teatro. Chegou uma altura que o teatro russo tinha de mudar. E nós aparecemos e encontrámo-los a eles no meio desta mudança.
Isso tem a ver com o movimento da nova escrita para teatro e a presença do Royal Court na Rússia?
– Nunca apresentámos as peças na Europa. Construímos o nosso mundo e vivemos no nosso mundo. E graças a uma ressonância e a alguém que foi ver os nossos espectáculos fomos para Londres. Contactaram-nos e criámos ligações. Foi como se entrássemos na corrente de uma dramaturgia nova, temos a noção de que existe uma dramaturgia com textos de qualidade dramática. Onde não é importante se o texto é novo ou velho.
Na Rússia existem mais autores da vossa idade?
– Na Rússia há muitos dramaturgos e muitos novos teatros que fazem só novas dramaturgias.
Em que é que acham que a vossa dramaturgia é diferente?
– No tempo das mudanças, quando o teatro começou a mostrar a vida que está a nossa volta, quando começámos a ter necessidade de escrever peças sobre a vida quotidiana, apareceram muitas pessoas a escrever novas peças. Mas onde se via a vida de uma maneira pouco madura. Os textos eram muito inocentes… As peças agitaram os teatros, mas depois os críticos e os encenadores disseram que agora ninguém sabia escrever. Acharam que não havia uma dramaturgia contemporânea. Só que quando conheceram textos nossos, acreditaram que afinal também sabemos escrever peças. E também apareceram outras pessoas que escrevem. Mesmo fazendo coisas diferentes, estamos dentro de uma tradição cultural, sabemos o que é uma peça de Shakespeare, uma peça de Tchékhov. E quando começamos a pensar numa peça nova, sabemos que estamos dentro de uma consciência dramatúrgica universal.
Quais foram os autores dessa tradição clássica que os influenciaram mais?
– Não há uma influência directa. Na nossa vida, na universidade, por causa daquilo que ensinámos (várias disciplinas, história da literatura, etc.), precisámos de ler muito, tínhamos de estar sempre a ler, e é aquilo que gostamos de fazer também, e falar disso com os estudantes.
Actores e encenadores
Já viram as vossas peças representadas em vários países, o que é que acharam dos actores?
– É sempre interessante perceber como um texto se enquadra noutra cultura. É um grande prazer para nós. Ver como é que vivem estas personagens. Com o corpo do actor, a mímica do actor, a língua dele, que traz consigo toda a cultura de um país e revive as personagens e o mundo da peça. Não podemos dizer se os actores são melhores ou piores. Talvez tenhamos tido muita sorte. Mas nunca estivemos numa situação em que não tivéssemos ficado satisfeitos. Em particular com o trabalho dos actores. Cada país tem a sua própria especificidade. É melhor não ser num teatro de encenador, onde o actor faz aquilo que o encenador diz. Muitas vezes o encenador não faz esta peça, faz um outro mundo, e muitas vezes esse mundo não é igual ao mundo da peça. Os encenadores russos habituaram-se a trabalhar com textos antigos, clássicos. Não podiam fazer esses textos assim como tinham sido escritos. Por isso habituaram-se a inventar. E às vezes temos muita pena dos actores, porque não sabem o que estão a fazer. Eles lêem uma coisa mas representam outra.
Quando escrevem preocupam-se em não dar muito espaço para o encenador inventar?
– Nós chamamos a atenção que aquilo que nós escrevemos tem de ser dito. Estas personagens têm de ser vividas. As personagens não precisam de um alibi, aquilo que fazem, fazem. É a vida. Porque, por exemplo na Rússia, num texto sobre a vida contemporânea, os encenadores têm vergonha de falar sobre as coisas. Eles pensam que temos de esconder aquilo que as pessoas fazem na vida real. E se existe uma cena de cama, onde se faz amor, eles escondem-na. Nunca podemos mostrar o que acontece na realidade. E se há palavrões não os podemos dizer. Aquilo que os encenadores pensam é que temos de falar num tom místico. Como quando há bocado brincávamos com o gravador. Mas o problema é fazer esta paisagem realista: aquilo que vemos nas encenações fora do nosso país e em particular em Lisboa. Aqui vimos, de uma maneira ou de outra, um mundo real, há momentos absurdos, mas estes momentos crescem do próprio real.
Pensar da mesma maneira, pensar coisas diferentes
A forma das vossas peças é muito original e diferente. Como é que chegam a essa forma?
– Não temos muita consciência disso. São sempre camadas em cima de camadas.
Planeiam a estrutura da peça antes?
– Desenvolve-se tudo ao mesmo tempo. Estar tudo construído, para nós, não é normal. Normalmente usamos uma estrutura com paragens, com cortes, como num mosaico, através do qual podemos desenhar o mundo e podemos criar uma impressão geral, global. Se a nossa consciência está à beira de um ataque de nervos é melhor fazermos qualquer coisa nova. Deixar uma pessoa a morrer nos escombros é horrível. Os críticos dizem que a nossa peça é pessimista, mas nós não pensamos assim.
Até que ponto o pensamento das personagens sobre o mundo é o vosso pensamento?
– É muito difícil dizer que algum pensamento é de alguém. Alguém já pensou as coisas. O pensamento é um produto do universo. E nós não nos queremos pôr do lado de ninguém.
Quando as personagens têm todas o mesmo pensamento, isso é o optimismo da peça?
– As pessoas pensam sempre da mesma maneira. (Muitos risos.) Acreditam todos no mesmo, por isso pensam sempre da mesma maneira. Alguém passa a opinião para outra pessoa, outra pessoa fala do barulho que a sua cama faz, mas tudo isso é o mesmo. Mas também podemos dizer que todas as personagens são diferentes e falam todas de maneira diferente. Algumas precisam de um ponto de apoio. Outras estão assentes num sistema de pontos cardeais. Houve uma crítica em Moscovo que se sentiu muito espicaçada pela peça, ela tinha na mala um spray e escreveu que durante a peça queria pegar nele, apontar para cena e disparar. Ela estava muito irritada. E ouviu essas mesmas palavras na peça. Não sei o que é que se passou com ela… mistério.
Podemos ver a peça Terrorismo como um sonho do passageiro?
– Podemos.
E os outros dois passageiros são uma espécie de representação irónica de vocês os dois? Falam em sintonia e completam as frases um do outro…
– Pode-se ler dessa maneira. Mas na peça há muitas armadilhas, que reduzem a nada qualquer teoria.
Se víssemos outros momentos da acção, a peça seria convencional: se, por exemplo, víssemos o passageiro a chegar a casa e apanhar o amante lá em casa. Isso é técnica? É um trabalho consciente?
– Os críticos dizem que nas peças de Tchékhov há uma lei (sobre a qual o Tchekhov também falava): se no primeiro acto aparecer uma espingarda, no último acto ela dispara. Nas nossas peças temos espingarda, mas ela não dispara. Nós chegamos ao clímax, mas não o mostramos. Talvez por isso as personagens não estão em situações normais e numa relação de causa-efeito. Gostamos de dar às pessoas coisas para elas pensarem, dar-lhes uma possibilidade de criarem a sua própria ideia. Também gostamos de arte assim. Há muitos autores conhecidos que impõem a sua ideia. Gostamos muito de Dante e da Divina Comédia, tem uma ideia do mundo estratificado e o texto é muito forte mas há uma ideia do autor muito presente e aquele que lê tem pouco espaço.
O medo
Terrorismo nasceu do medo?
– Tudo o que acontece no mundo, tudo o que nasce, o medo rodeia tudo: o medo de dar à luz, uma criança tem medo quando a tiram da barriga da mãe, temos medo de ir pela primeira vez à escola ou a um novo emprego, mas já não dizemos que isto é um medo. No mundo contemporâneo, o ser humano anda sempre muito perto da morte. O encontro com o inferno anda sempre presente. Talvez seja esse o grande medo dos dias de hoje. Faz-nos ver o outro com desconfiança. E todos terão uma forma de escapar a isso. Alguns têm medo: casam e fazem filhos; há outros que escrevem peças.
E outros ainda casam, fazem filhos e escrevem peças…
– Esses são os que têm muito medo. (Muitos risos.)
O medo também é uma das explicações para o protagonista de No Papel da Vítima: na última cena, entre o realizador e o argumentista, diz-se que ele faz de vítima para escapar à morte. Não acham que essa cena explica coisas demais?
– Não. Aquilo é só a opinião de quem fala. Mas foi muito importante mostrar outro lado que não o do protagonista. Mostrar o ponto de apoio. Seja como for, essas duas personagens da última cena fazem o papel de criadores que têm a noção de criarem um destino. Mas talvez estes próprios criadores não saibam o que estão a fazer, mas tenham de representar esse papel.
E nas cenas anteriores: podemos dizer que as cenas com a polícia e as cenas em família estão em níveis de realidade diferentes?
– Em parte, sim. Principalmente os monólogos do protagonista. São monólogos sinceros. Por isso em vez do nome pusemos só “:”, nestes momentos ele quer ser sincero. O diálogo com os pais é uma máscara.
Mas há uma série de ecos entre as cenas em casa e as cenas com a polícia. A cada cena em casa corresponde uma cena com a polícia através destes ecos temáticos, podemos ver uma cena como projecção da outra. Que ligação é esta?
– Há uma ligação. É a vida de uma pessoa. Assim como nasceu no mundo, assim como viveu, assim como morre no final, é tudo uma reconstituição do crime. Isso é importante. É o conceito global da peça. Lá em cima também há alguém que vai dizer quando é que vocês nasceram, como é que vocês viveram e por que é que vocês morreram.
Por que é que escrevem didascálias que não podem ser concretizadas no palco?
– Por exemplo?
Por exemplo quando quase no final da última reconstituição se descreve aquilo que se passa na cabeça de cada personagem.
– Fazemo-lo para ajudar os actores. Eles choram, não é? O actor tem de perceber por que é que está a chorar. Por um lado isso é interessante e por outro pode ajudar o actor.
Tem um efeito narrativo irónico.
– Sim. Se uma personagem chora, essa personagem mostra qualquer coisa sobre ela própria, ficamos com uma ideia dela. Estas ideias explicam o carácter dessa personagem.
Por que é que preferem que a cada personagem corresponda um actor?
– Se há a possibilidade de haver uma personagem por actor, isso é melhor. Mas se um actor faz várias personagens há várias ideias possíveis… Tudo depende.
A última peça. O cinema
Podem falar um pouco da peça que acabaram de escrever, Más Histórias de Cama?
– Todas as cenas se passam na cama. Há uma cena com duas mulheres, outra com dois homens, noutra um homem e uma mulher, noutra um homem velho e uma criança surda (o encenador que quer fazer a peça diz que esta cena é a melhor cena que alguma vez leu, nós não acreditámos). Nesta peça queremos pensar sobre as relações entre as pessoas, sobre a relação do homem com deus. Queremos mexer naquilo que o homem pensa sobre deus e naquilo que ele pensa sobre nós. Há uma cena nesta peça, em que se encontram dois homossexuais na cama: um é judeu e o outro é muçulmano. Cada um deles tem a sua própria relação com deus, e cada um deles pensa que o seu deus é o deus mais justo e por isso não conseguem fazer amor. Também temos duas pessoas de meia idade, uma mulher e um homem que vivem há muito tempo juntos e que se tentam lembrar do que se tem de fazer na cama. Este sítio, a cama, este espaço, é um lugar muito íntimo, onde uma pessoa está despida, sem defesas e onde se está sempre perto do outro. Achámos interessante dar a possibilidade de uma pessoa falar neste espaço. As cenas de cama são o motivo para a pessoa poder testar as condições e as bases em que está construído o mundo todo e a própria vida. Já foi feito um filme desta peça.
Acompanharam o processo das filmagens?
– Não. Estávamos em Inglaterra nessa altura, mas comunicávamos com o realizador. O filme já ganhou um prémio.
Terrorismo vai ser filmado agora?
– O argumento para cinema já está escrito, estão quase a começar, em Inglaterra também estão interessados. Já iniciámos uma conversa.
O vosso interesse está no teatro ou no cinema?
– No teatro e no cinema. Mas, claro, são mundos diferentes. O cinema pode impor-se visualmente. Pode dar-nos um grande plano. Pode filmar com grande angular, pode fazer uma panorâmica…
A vossa experiência no cinema influenciou a escrita da última cena de No Papel da Vítima?
– Não. É uma metáfora. Os professores dizem aos alunos na escola: “Na história do nosso país aconteceu isto mas não aconteceu aquilo.” Chegam a casa e os pais dizem-lhe: “Não. Aconteceu aquilo mas não aconteceu isto.” As pessoas estão num mundo onde cada um tenta impor as suas próprias ideias às outras pessoas. Chegas a um restaurante, põem-te uma sopa fria à frente, tu comes a sopa. Mas o problema está nas palavras que escolhes para explicares o que estás a sentir, se podes falar do teu ponto de vista ou não. Talvez o nosso destino dependa dessas pessoas que querem fazer de nós algo de seu. Que querem entrelaçar a nossa vida a algumas opiniões que têm. Talvez os actores consigam compreender isto. Porque acima dos actores há sempre uma peça, há sempre um encenador, há sempre outras opiniões, mas eles continuam sempre a ter a sua própria consciência. Porque somos todos feitos, cozinhados, da mesma maneira. É por isso que criámos estas personagens.
Entrevista realizada por António Simão, Francisco Frazão e Pedro Marques
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