John Kingsley Orton nasceu a 1 de Janeiro de 1933 e morreu em Agosto de 1967. Cresceu nos Saffron Lane Estates em Leicester, uma cidade industrial das Midlands. Orton é o mais velho de quatro filhos. A sua mãe, Elsie, trabalhou primeiro como operária de uma fábrica de meias e depois, quando deixou de ter visão, como mulher-a-dias; o seu dominado marido, William, era jardineiro da Câmara de Leicester. A vida na casa da família Orton era tanto emocional como materialmente bastante pobre. Em criança, Orton sofria de asma, o que significava que tinha de faltar frequentemente à escola. Quando chumbou no exame Eleven-Plus da Grammar School, a sua mãe, que sempre beneficiou John por ser o mais dotado dos filhos, juntou penosamente dinheiro para o mandar para a Clark’s College, uma escola privada, que com a sua vocação mais virada para o ensino comercial não era o ambiente mais próprio para Orton. Depois de deixar a escola aos dezasseis anos, nunca manteve um emprego por muito tempo – “fui despedido de todos os empregos que tive entre os dezasseis e os dezoito anos porque nunca me interessei por nenhum deles” – e voltou-se para os grupos de teatro amadores com a promessa de um envolvimento que a sua casa e o seu ambiente de trabalho nunca lhe proporcionaram. Após ter tido aulas de elocução com o objectivo de fazer desaparecer o seu ceceio e o seu sotaque local, Orton conseguiu entrar em 1950 para a RADA (The Royal Academy of Dramatic Art) com o apoio de uma bolsa da Câmara de Leicester. Mais tarde Orton foi depreciativo – “Eu não me dei muito bem na RADA… eu era mais entusiasta e sabia mais sobre representação no início do primeiro período do que no último” – mas foi na RADA que conheceu Kenneth Halliwell, que viria a ter uma influência decisiva na sua vida futura. Halliwell era sete anos mais velho que Orton e podia dar-lhe o conhecimento literário e os meios de independência financeira que lhe faltavam. Um mês depois de Orton chegar a Londres, mudou-se para o apartamento de Halliwell; a sua relação homossexual que, numa fase mais tardia iria sofrer alguns problemas, durou até ao fim. Em 1953, depois de deixar a RADA, Orton foi assistente de direcção de cena num teatro de repertório de província (Ipswich) durante quatro meses, mas não foi uma experiência que ele tenha gostado e voltou logo para Londres para junto de Halliwell. Halliwell encorajava a ambição que Orton tinha: escrever. E isolaram-se os dois no seu quarto de Islington, primeiro fazendo trabalhos conjuntos, escrevendo contos fortemente influenciados por Ronald Fairbank. Ronald Fairbank (1866-1926) exerceu uma influência em vários escritores de contos do século vinte que pode até parecer desproporcionada devido à ligeira e excêntrica natureza do seu trabalho. Ele apresenta ao leitor um mundo rarefeito, desprovido de valores, no qual as únicas virtudes são o cultivo de uma estética – através de um estilo de prosa exaustivo e fantástico – e uma inteligência crítica (às vezes com um sorriso escarninho) sofisticada. Por temperamento Orton partilhava das visões niilistas de Fairbank e foi talvez atraído pela possibilidade de elevar os seus dotes linguísticos até ao nível em que a defesa de Fairbank contra as investidas da escuridão – uma montra de fogos de artifício estilísticos – pudesse ser possível; mas havia demasiado de Firbank nos contos que Orton escreveu com Halliwell; não podiam ser publicados – tinham títulos como O Útero Mecânico e Os Últimos Dias de Sodoma. A pareceria de escrita antes dominada por Halliwell estava a acabar. Depois de 1957 Orton produzia principalmente trabalhos seus, embora demorasse mais uma meia dúzia de anos a descobrir a sua voz autêntica. A conjunta existência claustrofóbica teve uma crise em Maio de 1962 quando Orton e Halliwell foram acusados de danificar malevolamente 83 livros e arrancar 1653 ilustrações de livros de bibliotecas. Desde 1959 que, com a ajuda de Halliwell, Orton roubava livros de bibliotecas públicas, retirando imagens e usando-as para compor colagens bizarras, organizadas por Halliwell, que cobriam as paredes do quarto deles. A actividade era essencialmente uma prática subversiva e uma espécie de resposta pueril dirigida a um mundo literário que excluía Orton, apesar de, como Orton disse, “todo o lixo que era publicado”. Orton causava danos consideráveis quando executava os seus actos de desfiguração: “Fiz coisas como colar a imagem do nu de uma mulher por cima de um livro de etiqueta, por cima da autora que era, acho eu, Lady Lewisham. Fiz outras coisas, coisas muito estranhas… costumava escrever elogios falsos no interior dos livros de Gollancz porque descobri que os livros Gollancz tinham abas amarelas em branco que eu podia usar. As minhas considerações eram levemente obscenas. Até no tribunal disseram que eram levemente obscenas. Quando eu punha as capas plásticas outra vez nos livros não se conseguia perceber que os elogios não tinham sido impressos. Eu costumava ficar à coca depois de ter posto os livros na biblioteca outra vez e depois observava as pessoas a lê-los. Era muito engraçado. Muito interessante. Havia uma biografia de Sybil Thorndike que tinha uma fotografia dela trancada numa cela a fazer de Enfermeira Edith Cavell. Cortei a legenda de outra fotografia e colei-a debaixo da imagem, ficou: “Recebi muitos pedidos estranhos durante a guerra.” Uma das coisas interessantes do tribunal foi que o grande ultraje, aquele pelo qual fui parar à prisão, acho, era que eu tinha enfiado a cara de um macaco no meio de uma rosa, na capa de uma coisa chamada Collin’s Book of Roses. Era uma rosa amarela lindíssima.”A prisão confirmou o ponto de vista que Orton tinha sobre a sociedade – “A puta velha da sociedade levantou as saias, e o fedor foi nauseabundo” – mas de algumas maneiras a experiência deve ter ajudado: “Estar na prisa”, disse Orton, “trouxe distanciamento à minha escrita. Subitamente eu já não me envolvia, e a coisa funcionava”. A BBC aceitou a versão radiofónica da peça The Ruffian On The Stair, e ele começou a trabalhar numa peça maior, Entertaining Mr. Sloane, o seu primeiro triunfo. Entre 1994 e 1967 as suas peças (Loot, The Good e Faithful Servant) conhecem enormes triunfos em Londres e na Europa. Joe Orton morreu assassinado em 1967, tendo deixado inédita Pelo Buraco da Fechadura. Em Portugal a sua obra está ligada a Carlos Fernando e ao Teatro da Graça que montaram O Rufia na Escada, Comédia de Horrores e Sloane. Mas textos seus atraíram também encenadores como Luís Miguel Cintra e Rogério de Carvalho.
Do autor nos Livrinhos de Teatro:
O Nosso Hóspede/ A Saque (nº 5)
Nas Revistas Artistas Unidos:
Dossier: Joe Orton (Revista nº 12) Contém os seguintes artigos e textos:
Joe Orton, Realista e Satírico – por John Lahr
Joe Orton passou por aqui…- por Maria Helena Serôdio
Onde pensar o mundo – por Pedro Marques
Orton, ainda? – por Jorge Silva Melo
Nos Artistas Unidos:
2004 – O NOSSO HÓSPEDE, encenação de Manuel João Águas (Teatro Taborda).