NO PAPEL DA VÍTIMA dos Irmãos Presniakov

No Papel da Vítima

NO PAPEL DA VÍTIMA dos Irmãos Presniakov
Tradução Nina e Filipe Guerra Com Joana Bárcia, Isabel Muñoz Cardoso, Elsa Galvão, Teresa Sobral, João Meireles, Miguel Telmo, Américo Silva, António Filipe, António Simão, Pedro Carraca Cenografia Rita Lopes Alves e João Calvário Figurinos de Rita Lopes Alves Assistência de cenografia Sílvia Silva Luz Pedro Domingos  Encenação Jorge Silva Melo assistido por Andreia Bento e João Miguel Rodrigues Uma produção TNDMII/AU

Estreia 7 de Outubro 2004 no Teatro Nacional D. Maria II

Um rapaz deixa a Universidade e entra para a polícia. Não fez nada de mal, quer apenas um emprego. Um emprego especial. Representar o papel da vítima em reconstruções de crimes. Talvez estando perto da morte possa enganar a sua própria morte.

“Não sou estúpido. Há muito tempo que percebi que para evitar fazer algo tens que fazer outra coisa qualquer. Se queres evitar qualquer coisa desagradável, tens que fazer outra coisa de que não gostas mas que te ajuda a evitar o pior.”

Vália, 30 anos, ganha a vida com a polícia: representa o papel da vítima nas reconstituições de crimes. Numa piscina ou num fast food japonês, Vália morre precisamente como lhe é pedido, exactamente como no original. E quando a reconstituição se transforma no próprio crime? Quem deve representar o papel da vítima? Uma estranha noite no teatro no melhor da tradição russa, divertida, lacónica, absurda e cheia de surpresas.

no_papel_da_vitima_bA peça funciona por montagem alternada: a uma sequência num interior familiar (pai, mãe e filho) segue-se outra no local onde um crime foi cometido e uma reconstituição vai ter lugar (com criminoso, polícias e “vítima”). Tudo indica que a voz que fala como filho seja a mesma de Vália, o rapaz de boné dos desenhos animados South Park que faz de vítima nas reconstituições. Ou talvez uma seja a projecção da outra (caixas dentro de caixas); não podemos é deixar de reparar nos pormenores que ligam as cenas familiares às policiais: uma retrete, uns calções de banho, uns pauzinhos chineses. O clímax, hilariante, vai ser a reconstituição da reconstituição de um crime, número musical incluído.

No Papel da Vítima (com o título Playing the Victim) teve estreia mundial a 12 de Agosto de 2003, no Traverse Theatre de Edimburgo, durante o Festival de Edimburgo, numa co-produção Told by an Idiot/ Royal Court com direcção de Richard Wilson e a seguinte ficha técnica: cenografia de Nicolai Hart Hansen; luzes de Colin Grenfell; som de Ian Dickinson; com Hayley Carmichael, Michael Glenn Murphy, Paul Hunter, Amanda Lawrence, Ferdy Roberts, Andrew Scott.

Da Crítica
NO PAPEL DA VÍTIMA é a nova farsa dos irmãos Presniakov que constroem aqui uma comédia surreal a partir dos traumas encapotados da Rússia. À medida que Vália se move de uma reconstituição para outra emerge um sentido pungente da nova Rússia, enraizado na velha corrupção burocrática, na ambiguidade moral e alienação espiritual, mas lutando contra as novas pressões do multiculturalismo e da história política recente.
Claire Allfree

Não há dramaturgos contemporâneos com uma aproximação tão estranha à vida de hoje como os autores de NO PAPEL DA VÍTIMA. A sua nova e cativante farsa negra, enraizada no mundo deprimido e às vezes deprimente do Teatro do Absurdo, parte próximo da realidade e entra numa exuberante fantasia como a que descreve a Rússia irremediavelmente presa na burocracia e corrupção.(…) O anti-herói de 30 anos, Valia, é um brilhante desistente da Universidade que vive com os seus pais, pessoas simples. Como que para enfatizar a sua alienação ele escolher uma carreira de tempo inteiro representando o papel da vítima. A sua escolha masoquista não é o que parece, é-lhe apenas pedido que faça de cadáver nas reconstituições em vídeo que polícia faz dos crimes (…).Valia, encarnando uma jovem esfaqueada numa casa de banho à beira-rio pelo seu amante, um homem que afogou a amante numa piscina e um outro que esquartejou um colega de escola num restaurante japonês, insurge-se contra os russos rígidos e extremamente controlados. Estas personagens movem-se no limite do rídiculo, mas estão ainda ancoradas na realidade. Os Irmãos Presniakov captam o sentido perturbador da Rússia e dos russos tomados pela anarquia e alienação.
Nicholas de Jongh