ORGIA de Pier Paolo Pasolini

Orgia

ORGIA de Pier Paolo Pasolini
Tradução Pedro Marques Com José Airosa, Sylvie Rocha e Sofia Correia Cenografia e figurinos Rita Lopes Alves Assistente de cenografia Daniel Fernandes Apoio Vocal Rui Baeta Encenação e luz de Pedro Marques Operador de som e luz João Cachulo  Assistência de encenação Ricardo Carolo
Uma produção A&M / Artistas Unidos / Culturgest.

Estreia no Teatro Viriato (Viseu) 10 e 11 de Fevereiro de 2006
No TAGV (Coimbra) 15 e 16 de Fevereiro de 2006
Na Casa das Artes de Famalicão 17 e 18 de Fevereiro de 2006
Em Bragança, no Teatro Municipal 3 de Março de 2006
No Porto, no Rivoli-Teatro Municipal de 9 a 18 de Março de 2006
Na Guarda, no Teatro Municipal a 23 de Março de 2006
Em Lisboa, na Culturgest de 29 de Março a 6 de Abril de 2006
No Teatro Virgínia (Torres Novas) a 8 de Abril de 2006

Orgia é a crónica das pobres emoções sadomasoquistas de dois cônjuges pequeno-burgueses no calor de uma desoladora Páscoa, da fuga-suicídio de uma esposa-amante-escrava, da devastação do esposo ao encontrar-se com uma pequena prostitutazinha de passagem, do seu extremo delírio fetichista e transsexual até ao seu suicídio por enforcamento.

Tratar-se-á de uma longa tortura (…). A inocência está perdida, morta para sempre como o antigo mundo rural reevocado com poética nostalgia: vítima e carrasco trocam de papéis continuamente, totalmente comprometidos com uma vida que já não lhes pertence, que aceitam que corra longe deles, sem atenuantes. (…) É muito mais do que a reivindicação da homossexualidade: é a exploração de um rumo que está perto quer da origem quer do futuro, uma tentativa de recomposição, de um olhar profundo que devolva a liberdade a uma vida consumida em papéis sufocados. (…) Este dia de Páscoa comprido e obscuro, que esvanece num início de outono, acaba com um homem-mulher novo, enforcado como um crucifixo pelas cadeias esticadas na cama, lugar de desejo, sexo, horror, ruína, morte e luz.
Massimo Marino, Tuttoteatro, 16 de maio 2004

Mais do que uma peça de teatro, Orgia pode ser definido um poema a várias vozes, ou um oratório laico que exprime, entre lirismo e declaração, os temas preferidos de Pier Paolo Pasolini. A crise da sociedade é representada através de uma obsessão individual, em que o mistério da geração de filhos e o problema da identidade pessoal encontram a obsessão do sexo, objecto de culpa e meio de conhecimento: eis então o delírio, contado, saboreado e seccionado, de um casal sado-masoquista, uma orgia sangrenta de palavras que encontra a sua própria essência no reconhecimento da diversidade.
Franco Quadri, Panorama, 10 de maio 1982

A obra de Pasolini (1922-75) reflecte as inquietações presentes em toda a carreira do cineasta. É uma tragédia contemporânea sobre a diversidade, impulsos obscuros e violentos que movem o ser humano em busca de ruptura por liberdade diante da “escravidão” de sentimentos imposta pelas sociedades.

Não é uma história pornográfica ou erotizada, Orgia pertence ao terreno das ideias. É um teatro de palavras conjugadas pela carne.

No “Manifesto por um novo teatro” que lançou em 1968, Pasolini defende uma terceira via entre o teatro burguês convencional e o teatro experimental, “do grito”.

O teatro que esperamos, mesmo o mais absolutamente novo, não poderá ser o teatro que esperamos. De facto se esperamos um novo teatro, esperamos necessariamente dentro das ideias que já temos, além disso, aquilo que esperamos, de alguma forma já existe.

A quem se destina
orgia_aOs destinatários desse novo teatro não serão os burgueses (que vão ao teatro para divertir-se e que, às vezes, se escandalizam) mas sim, os grupos avançados da burguesia constituídos pelos poucos intelectuais realmente interessados em cultura: progressistas de esquerda, sobreviventes do laicismo liberal e radicais. Esses grupos avançados não se divertirão nem se escandalizarão já que são semelhantes em tudo ao seu autor. Esta classificação é e pretende ser esquemática.
Aconselha-se calorosamente a uma senhora que frequente os teatros da cidade que não assista às representações do novo teatro. Ou, caso se apresente com o seu simbólico, patético, casaco de vison encontrará na entrada um cartaz a explicar que as senhoras com casacos de vison deverão pagar um preço trinta vezes mais alto que o preço normal. Nesse mesmo cartaz, pelo contrário, estará escrito que os jovens fascistas de vinte e cinco anos poderão entrar de graça. Além disso, pediremos também que não aplaudam. Vaias e outras formas de desaprovação serão admitidas.

O teatro da palavra
O novo teatro quer definir-se como Teatro da Palavra. Incompatibiliza-se tanto com o teatro tradicional como com todo o tipo de contestação ao teatro tradicional. Remete explicitamente para o teatro da democracia ateniense, saltando completamente toda a tradição do teatro burguês, e porque não dizer a inteira tradição moderna do teatro renascentista e de Shakespeare. Espera-se que o espectador oiça mais do que veja. As personagens são ideias a serem ouvidas.

Destinatários e espectadores
É um teatro possibilitado, solicitado e desfrutado no círculo cultural dos grupos avançados de cultura.
É o único que pode chegar, não por determinação ou retórica, à classe operária. Já que esta se encontra unida por uma relação directa aos intelectuais.
O Teatro da Palavra opõe-se ao teatro da conversa (tradicional) e ao teatro do gesto e do grito (não tradicional). Desta dupla posição nasce uma das principais características do Teatro da Palavra: a ausência quase total de acção cénica, desaparecendo quase totalmente a encenação. Reduzindo todos os seus elementos (luz, cenário, figurinos, etc…) ao indispensável. Não deixará de ser uma forma de rito (ainda que jamais experimentada). O seu rito não pode ser definido de outro modo que não seja um Rito Cultural.

O actor do teatro da palavra
O actor do Teatro da Palavra não terá que apoiar as suas faculdades com uma especial atracção pessoal (teatro tradicional), ou numa espécie de força histérica messiânica (teatro não tradicional), explorando demagogicamente o desejo de espectáculo do espectador (teatro tradicional), ou enganando o espectador através da implícita imposição de fazê-lo participar num rito sagrado (teatro não tradicional). Terá que sustentar as suas faculdades na sua capacidade para compreender realmente o texto e ser assim, veículo vivo do próprio texto. Será melhor actor quanto mais o espectador, ao ouvi-lo dizer o texto, compreenda que o actor compreendeu. O actor do Teatro da Palavra terá de ser simplesmente um homem de cultura.

Epílogo
O Teatro da Palavra é um teatro completamente novo porque se dirige a um novo tipo de público.
O teatro da Palavra não tem nenhum interesse espectacular, mundano, etc… o seu único interesse é cultural, comum ao autor, aos actores e aos espectadores, que portanto, quando se reúnem, cumprem um Rito Cultural.