PERDOAR HELENA de José Tolentino Mendonça
Com Alhelí Guerrero, Pedro Martinez, John Romão Cenografia e figurinos Sara Amado Luz José Álvaro Correia Música Sérgio Delgado Dramaturgia Jacinto Lucas Pires Encenação Marcos Barbosa
Uma produção .lilástico/ Artistas Unidos
No Teatro Taborda de 24 de Março a 24 de Abril
Há um encenador que horas antes da estreia cancela o espectáculo e abandona a actividade. Há um actor cuja vida rola sem regresso. Há a migração clandestina detectada dentro dos textos do teatro grego, uma verdadeira infiltração. As Tragédias estão cheias de estrangeiros que chegam de toda as parte: mensageiros, amas, serviçais, transeuntes, jovens guerreiros, campesinos… Há a última viagem dos grous pelos céus do sul. O mundo, o nosso mundo, quando se move parte em busca de quê?
Entre os protagonistas que se destacam no ciclo épico troiano, Helena é talvez quem recebe caracterização mais negativa. E não por ser modelo de violência ou da mesquinha impiedade que tanto horror gerava, mas pela sua beleza, pela sua “beleza má”, como a designou Hesíodo. Esta beleza, associada à ruptura familiar, determinou a guerra espaventosa entre os povos da Acaia e de Tróia. A questão não era, contudo, pacífica para o teatro grego.
Há dois textos dramáticos do séc. V que assumem o destino de Helena em chave dialéctica. O primeiro é As Troianas, de Eurípedes. Coloca-se em cena o desespero das cidadãs perante a queda da cidade. Em atmosfera de devastação, entre lamento e denúncia, os motivos desta dor totalitária são revividos. Este é um teatro-libelo contra uma beleza, a de Helena, que não podia ser descrita como “esplendor da justiça”, pois era um elemento irresistível, quase misterioso, que subverteu e fez naufragar a recta ordem ética. E Helena é condenada.
No Encómio de Helena, escrito de Górgias, tenta-se mostrar o contrário. Helena é inocente, pois não podia agir de outro modo. Sobre ela pesavam: a imposição da vontade dos deuses; a violência do poder masculino; a força enganadora da persuasão retórica, capaz de produzir a falsidade. E ela é absolvida.
Partindo destas abordagens díspares às razões de Helena, procura-se pensar o significado e os limites da responsabilidade pessoal no destino da cidade; como se articulam culpa do indivíduo e culpabilização social; e, sobretudo, como a procura da justiça nos deixa muitas vezes perante interrogações que não têm apenas uma resposta.
Este é um relato para três actores.
José Tolentino Mendonça
Depois de quatro peças escritas por Jacinto Lucas Pires, o .lilástico começa um novo ciclo procurando trabalhar com outros autores que possam integrar a nossa dinâmica de uma escrita que se desenvolve durante o processo de ensaios.
Nas peças anteriores houve uma ligação cada vez maior entre a encenação e a escrita, que se evidencia na passagem das sistemáticas de simples provocações de movimento dos actores durante os ensaios para acções significativas no texto.
Agora com José Tolentino Mendonça, a ideia é, do mistério da sua escrita, das suas palavras que vêm do mundo da poesia, construir com os corpos dos actores, um espectáculo que guarde essa qualidade de vislumbre mas que encontre no palco o gesto tão próprio do teatro.
Marcos Barbosa
José Tolentino Mendonça é Licenciado em Teologia, Mestre em Ciências Bíblicas e finaliza uma tese de Doutoramento nesta área. Poeta, publicou vários títulos a partir de 1990 (Os dias contados, 1990, As estratégias do desejo, Ed. Cotovia, 1995, Longe não sabia, Ed. Presença, 1997. A que distância deixaste o coração (com fotografias de Vicente Moreira Rato), Ed. Assírio e Alvim, 1998. Baldios, Ed. Assírio e Alvim, 1999. De igual para igual, Ed. Assírio e Alvim, 2001. Traduziu também O cântico dos cânticos e a poeta italiana Cristina Campo. Perdoar Helena é a sua primeira incursão no teatro.
O .lilástico é uma companhia de teatro fundada em 1999 e que tem realizado um trabalho de criação, centrando-se na procura de uma nova dramaturgia em língua portuguesa. Sendo uma companhia independente, o lilástico tem colaborado com diversas instituições, como o Teatro Nacional S.João, o Centro de Artes performativas do Algarve, a Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão ou o Teatro de la Ciudad de Monterrey, no México. Estas co-produções ou acolhimentos têm-nos permitido trabalhar com actores e criativos de diferentes cidades e com diferentes antecedentes.
Em 2000 o grupo estreou Variações Sobre os Patos, de David Mamet, no convento de São Vicente de Fora, em Lisboa; foi apresentado Trofa e no México (Teatro de La Ciudad de Monterrey).
Em 2001 apresentou no Porto, no Espaço Maus Hábitos Escrever, falar, de Jacinto Lucas Pires; em Junho de 2002 a peça foi apresentada em Tondela, na Acert; e em finais de Julho do mesmo ano em Lisboa, no Teatro Nacional D. Maria II, na sala-estúdio. Em 2004 a peça foi reposta na sala pequena do Rivoli, no Porto, no âmbito do festival Portogofone (prod. lilástico/TNSJ).
No fundo no fundo , de Jacinto Lucas Pires, o terceiro espectáculo do .lilástico, estreou no final de Agosto em Faro, no Centro de Artes Performativas do Algarve; insere-se na iniciativa Escritas por medida, do Dramat – Centro de Dramaturgia Contemporânea do Teatro Nacional de S. João, e foi também apresentado em Lisboa (Teatro da Garagem), no Porto (Teatro Helena Sá e Costa) e em Famalicão (Casa das Artes de Famalicão).
Em Junho de 2003 apresentou no Porto Os Dias de Hoje, um texto original de Jacinto Lucas Pires, integrado na programação do FITEI. O espectáculo esteve depois em Famalicão na Casa das Artes em Setembro do mesmo ano.
Coimbra b , de Jacinto Lucas Pires, é a última produção do .lilástico; estreou em Coimbra em Outubro de 2003 integrado na programação da Coimbra Capital Nacional da Cultura 2003.
Marcos Barbosa frequentou o curso de Teatro na Mountview Theatre School, Londres. Participou como actor em Fool For Love, Baby With a Bath Robe, The WomanWho Cooked Her Husband, Mountview Theatre, Londres. Curso de Teatro com Diakonos Physical Theatre, Londres. Concebeu Or What, apresentado no Edimburg Fringe Festival. Curso de Teatro na École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq , Paris. Participou como actor em Death of aSalesman, de A. Miller, Diakonos Physichal Theatre, Londres. Estreou-se como profissional em Portugal, no espectáculo Roberto Zucco, de B. M. Koltès, Teatro Só, Porto. Participou ainda na Queima do Judas, produzido pela Culturporto. Encenou e interpretou Imperfeito, Mais Que Breve – um espectáculo teatral para as comunidades portuguesas, com texto de Jacinto Lucas Pires, levado a cabo em Pretória, África do Sul. É fundador e director artístico do .lilástico. Em 2000, encenou o espectáculo Variações Sobre os Patos, de David Mamet, onde também participou como actor. Encenou o espectáculo Pervertimentos, de José Sinisterra, com o grupo La Percha Teatro, Monterrey, México – primeiro prémio da Mostra Estatal de Teatro de Nuevo Leon, Junho de 2002. Encenou Montras de solidão, de José Carretas e Marcos Barbosa, para Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura, Porto. Em 2001, encenou Escrever, Falar, de Jacinto Lucas Pires, com o .lilástico. Em 2002, encenou No fundo no fundo e em 2003 Coimbra b, textos de Jacinto Lucas Pires, com o .lilástico. Escreveu e encenou Oxímoro em 2003 em Monterrey, México, e o monólogo Corazón Transparente, de Jacinto Lucas Pires. Orienta oficinas de teatro e movimento criativo.