PROMETEU AGRILHOADO / LIBERTADO de Jorge Silva Melo
Com Miguel Borges , Ivo Canelas, Paulo Claro, Pedro Carraca, Luís Gaspar, Rui Lopes, Pedro Matos, Isabel Muñoz Cardoso, Teresa Roby, Sylvie Rocha, Hugo Samora, Américo Silva, António Simão e Manuel Wiborg Cenografia e figurinos Rita Lopes Alves assistida por Isabel Boavida Luz Pedro Domingos Pintura Sofia Areal Fotografia Susana Paiva Movimento João Fiadeiro Direcção musical José Eduardo Rocha Secretariado de produção Ivone Costa Produção Pedro Caldas e Margarida Wellenkamp Encenação Jorge Silva Melo assistido por Lucinda Loureiro e João Meireles
Uma co-produção dos Artistas Unidos com o INATEL / Ministério da Cultura.
Estreia Teatro da Trindade, 15 de Maio de 1997.
Os textos estão publicados em Prometeu – Rascunhos, (Ed. &etc) e no nº 5 da revista DiVersos.
O teatro que me interessa não tem nada, nada, nada mesmo, nada a ver nem com a magia nem com as variedades. Penso num teatro que foi possível ser o próprio corpo do pensamento, a vivência concreta da Cidadania – da História e da Política. A subordinação do “teatro” ao “espectáculo” (cenográfico, comemorativo, histórico, mundano…) implica um abandono progressivo da meditação colectiva sobre A Cidade. Tem isso a ver com a abstrusa evolução do conceito de encenador – recentemente transformado em “empresário”/director geral, nome de marca ou de perfume… E eu não entendo um teatro sem escrita. Ora foi, precisamente, o “autor” quem foi sendo retirado do teatro. Também por isso, ao propor-me um trabalho sobre o “Prometeu”, não quis ser como as máquinas de lavar que dão aos frescos as velhas cores. Não suporto o palco como paráfrase (dá-me sono); se já só podemos parafrasear, re-escrevamos.
[…]
Há aquele atelier do Courbet, uma modelo nua posando talvez ao centro de um quadro onde tudo cabe, até o Baudelaire lendo um livro ao canto inferior direito. E foi com essa ideia na cabeça, usando o palco como máquina expositiva, exposição dos temas e variações, máquina de ideias musicais e pictóricas, numa referência que sempre quis aos espaços vertiginosos de Tintoretto (fui revê-lo ao Prado, como eu me sinto bem com aquela balbúrdia) que ousamos aproximar-nos dos clássicos como estes mortos. Com a nossa vida e os nossos amores. Talvez assim, às apalpadelas do palco, talvez em juntando, a pouco e pouco, tantos dos nossos amigos, artistas, espectadores, seminaristas, talvez este projecto de apropriação dos clássicos, talvez este projecto em aberta transformação, que provavelmente nem aqui vai acabar, talvez isso possa realmente ser uma meditação. Sobre nós. Um teatro? Era, era isso o teatro. Talvez o que nos ficou depois do comunismo.
Jorge Silva Melo
Maio de 1997
Agrilhoado, libertado e, também, portador de fogo, eis como vejo este trabalho de excepcional valia de Jorge Silva Melo, seguramente um dos mais importantes factos teatrais, entre os vindos à cena, em Portugal, nos últimos anos, quer pela escrita quer pela realização da mesma, nas tábuas.
Fernando Midões
Diário de Notícias, Junho 1997