QUANDO A POESIA É O QUE RESTOU DA VOZ

Poesias e Outras Bizarrias

Conversa-fiada sobre poesia e voz
No CCB 21 de Março de 2009
Com Andreia Bento, João Meireles, Pedro Lacerda, Sílvia Filipe, Sylvie Rocha e Jorge Silva Melo

Foi da voz que nasceu a poesia?
Lembra-te Barbara
Chovia sem parar em Brest nesse dia
Jacques Prévert, trad. Manuela Torres

Um passeio pela poesia ocidental e a sua relação com a oralidade, uma conversa por aí fora que começa em Prévert cantado por Mouloudji ou dito por Cora Vocaire.
Rappelle-toi Barbara
Il pleuvait sans cesse sur Brest ce jour-là
Jacques Prévert

Mas onde lemos Píndaro e a poesia grega.
Alma, não aspires à vida eterna, esgota o possível
Pindaro, Pítia III
Ouvimos John Guilgud e sonetos de Shakespeare, lemos Racine (quando o teatro era a poesia?) e Auden traduzidos por David Mourão-Ferreira.
Não há contudo lugar para nós, meu amor, não há contudo lugar para nós
W.H. Auden, Canção, trad.Mourão-Ferreira
E onde vamos até à língua portuguesa, língua fixada em Camões, lavada por Garrett,
Pescador da barca bela
Onde vais pescar com ela.
Que é tão bela,
Oh pescador?
Garrett
Língua de olhos limpos que encontramos nos bilhetes do Eléctrico de José Gomes Ferreira.
Há lá renda que se assemelhe
a este tecido de árvores no Ar…
(Hei-de pedir à Maria Keil
para as pintar.
José Gomes Ferreira. Eléctrico

E ouvimos Vittorio Gassman lendo Pavese, Verrà la morte e avrà i tuoi occhi, Ungaretti por ele próprio, Dante por Carmelo Bene, veremos Sérgio Godinho cantando Os Dias Úteis (a poesia é a sua voz?)
A alegria
É o que nos torna
Os dias
Úteis
Sérgio Godinho
E ouviremos Paul Celan, ele próprio

E terminaremos com a Carta a Meus Filhos Sobre os Fusilamentos de Goya, o estupendo Jorge de Sena.
Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Jorge de Sena
E, claro, a “Winterreise” de Schubert-Müller, cantada por Hans Hotter… Será a poesia o que restou da voz, eco/ da invençã̃o de um outro, quando diz, como escreveu Manuel Gusmão?