Nascido em 1964, passa a sua infância e a sua adolescência no bairro popular de Yparraguirre de Grand Bourg, na periferia de Buenos Aires (Argentina). Trabalhou como verdureiro, talhante e criativo numa agência de publicidade, empregos que abandonou para se dedicar ao teatro. Em 1989 funda a sua própria companhia em Madrid, La Carnicería Teatro [O Teatro Talho]. Numa Espanha Pós-Franquista, semeia a confusão e a sua escrita revela as artes plásticas e o vídeo, representando uma sociedade confinada à sua podridão. Privilegiando um teatro experimental e de forte discurso político, os seus trabalhos são conhecidos por não fazerem concessões e explorarem uma linguagem crua e violenta do corpo do actor em cena. Hoje vive nas Asturias (Espanha) e em São Salvador da Baía (Brasil).
Rodrigo García não é apenas “o autor de textos que explodem como bombas”, para além de dramaturgo, também é encenador, cenógrafo e videasta. As suas peças foram produzidas pelo Festival d’Avignon, o Centro Dramático Nacional de Madrid, o Teatro Nacional de Bretanha, a Bienal de Veneza, o Festival de Outono de Paris, a Schaubunne, entre outras instituições e festivais de renome. Em Portugal, apresentou as suas peças com alguma regularidade no Festival Citemor (Montermor-o-Velho), tendo apresentado em Lisboa apenas uma peça, “Ronald, o palhaço do McDonalds” (CCB, 2002).
As principais influências da sua escrita são Samuel Beckett, Harold Pinter, Fernando Arrabal, Quevedo, Céline, Thomas Bernhard, Buñuel e o período negro de Goya. É o dramaturgo contemporâneo estrangeiro mais representado em França. Em 2008, a UNESCO atribui-lhe o Prémio Europa de Teatro – Novas Realidades Teatrais.
O EXAGERO COMO A MEDIDA JUSTA E NECESSÁRIA
Moralista paradóxico, Rodrigo García volta às origens do ritual do teatro – o seu papel, o seu impacto, o que está aí em jogo – activando todos os sentidos do espectador, no transcorrer de uma experiência ora íntima ora pública. Este teatro espera, em todos os sentidos da palavra, uma reacção: sensitiva e intelectual, intempestiva, dubitativa. Poderíamos pensar que exagera quando nos mostra em detalhe quando cavamos as nossas próprias covas, cegamente. Mas será que é ele que exagera? Quando em realidade se empenha em que o seu teatro seja o olho do ciclone, um espaço efémero, depositório de ruído e da fúria das nossas sociedades domésticas e guerreiras. Aqui, o exagero é a condição para medir o estado das coisas.
Rodrigo García trabalha em função da cristalização dos “lugares comuns”, procura o contacto com os nossos demónios e demais mitologias contemporâneas. Nas suas fábulas, mostra como a publicidade se infiltrou em todos os lugares da nossa existência, substituindo-se à política. Arma e desarma tudo o que cremos conhecer mas que, no entanto, não queremos ver: a nossa implicação pessoal crescente neste sistema. Por isso é-lhe colocada a etiqueta de “provocador”. Mas não seria tal sentimento de provocação o sinal de que o seu trabalho desperta a nossa capacidade de ser espectadores ainda vivos, capazes de maravilhar-nos, de exercer o nosso juízo, de indignarmo-nos? O jogo insolente de teatro contra a seriedade mórbida das máscaras sociais. Rodrigo García avança sobre o campo minado do mundo, imita-o, mete-o à prova, como uma espécie de jogo, exaspera-o até fazê-lo cair dentro do teatro.”
De tal salpicar perigoso surge uma arte frágil e inquieta, de reflexão e de combate. Recusando a política da avestruz, convida-nos a não perder a esperança dos encantos da representação. Como prova de futuras sublevações alegres e emancipadoras.
Desde há uns anos, sabe enfrentar o êxito e as sirenes da fama mercantil. Irredutível à moda que o rodeia e o elogia para melhor denegri-lo depois de ter passado a onda, soube travar a espiral da produção exponencial e privilegiar a artesania de um processo de criação cada vez mais profundo.
PHILIPPE MACASDAR
Director do Théâtre de Saint-Gervais de Genebra